Homilia do D. Henrique
Soares da Costa – Santíssima Trindade – Ano C
Pr
8,22-31
Sl 8
Rm 5,1-5
Jo 16,12-15
Sl 8
Rm 5,1-5
Jo 16,12-15
É
estranho celebrar com uma festa litúrgica a Santíssima Trindade, pois a
Trindade Santa é celebrada em toda a vida cristã e, particularmente, em
toda e cada Eucaristia. Recordemos que a Missa é glorificação da Trindade
Santíssima, na qual o Filho se oferece e é por nós oferecido ao Pai no Espírito
Santo, para a salvação nossa e do mundo inteiro. Mas, aproveitando a festa
hodierna, façamos algumas considerações que nos ajudem na contemplação e
adoração desse Mistério tão santo, que nos desvela a vida íntima do próprio
Deus.
Poderíamos
começar com uma pergunta provocadora: como a Igreja descobriu a Trindade?
Descobriu, como duas pessoas se descobrem: revelando-se! Duas pessoas somente
se conhecem de verdade se conviverem, se forem se revelando no dia-a-dia, se se
amarem. Só há verdadeiro conhecimento onde há verdadeiro amor. É costume
dizer-se que ninguém ama o que não conhece; pois, que seja dito também: ninguém
conhece o que não ama. O amor é a forma mais profunda e completa de
conhecimento! Foi, portanto, por puro amor a nós, à nossa pobre humanidade, que
Deus quis dirigir-se a nós, revelar-se, convivendo conosco, abrindo-nos seu
coração, dando-nos a conhecer e a experimentar seu amor… E fez isso
trinitariamente! Então, desde o início, a Igreja experimentou Deus na sua vida
concreta, e o experimentou trinitariamente, como Pai, como Filho e como
Espírito Santo. Antes de falar sobre a Trindade, a Igreja experimentou a
Trindade!
Primeiramente,
o Senhor Deus incutiu no coração do povo de Israel e da própria Igreja que ele
é um só: “Ouve, ó Israel, o Senhor nosso Deus, o Senhor é um só!” Um porque não
pode haver outro ao seu lado, Um porque não pode ser multiplicado, Um porque
não pode ser dividido e Um porque deve ser o único horizonte, o único apoio, a
única rocha de nossa existência: ele, o Senhor Deus, é o único absoluto, o
único que é, sem princípio e sem fim, sem mudança e sem limite! Jamais
poderemos imaginar tal grandeza, tal plenitude, tal suficiência de si mesmo!
Deus É – e basta! Tudo o mais apenas existe porque vem dele, daquele que É!
Mas, ele não é um Deus frio: sempre apresentou-se ao povo de Israel como um
Deus amante, um Deus de misericórdia e compaixão, um Deus que não sossega
enquanto não levar à plenitude da vida as suas criaturas. Por isso, com
paciência e bondade, conduziu o seu povo de Israel, formando-o, educando-o,
orientando-o e prometendo um futuro de bênção e plenitude, de eternidade e
abundância de dons, que se concretizaria com um personagem que ele enviaria: o
Messias, seu Ungido.
Esse
Messias prometido, nós, cristãos, o reconhecemos em Jesus, nosso Senhor. Ele é
o enviado de Deus, do Deus único, Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó, Deus do
povo de Israel. A esse Deus tão grande e tão santo, Jesus chamava de Abbá –
Papai: o meu Papai! A si mesmo, Jesus se chamava “o Filho” – Filho único,
unigênito de Deus, Filho Amado! Mais ainda: o próprio Jesus, que veio para nós
e por amor de nós, agiu neste mundo, em nosso favor, com uma autoridade que
ultrapassava de longe a autoridade de um simples ser humano: ele agia como o
próprio Deus. Não só interpretava a Lei de Moisés, como também a modificou e a
ultrapassou; perdoava os pecados, exigia um amor e uma obediência absolutos à
sua pessoa… amor que somente Deus pode exigir. Jesus se revelava igual ao Pai,
absolutamente unido a ele: “Eu e o Pai somos uma coisa só! Quem me vê, vê o
Pai. Eu estou no Pai e o Pai está em mim”. Após a ressurreição, a Igreja
compreendeu, impressionada, maravilhada: Jesus não somente é o enviado daquele
Deus a quem chamava de “Pai”, mas ele é igual ao Pai: ele é Deus como o Pai, é
eterno como o Pai, é o Filho amado pelo Pai desde toda a eternidade. Então, o
Deus de Israel é Pai, Pai eterno, Pai eternamente, que eternamente gera no amor
o Filho amado. Por amor, ele nos enviou este Filho: “Verdadeiro homem,
concebido do Espírito Santo e nascido da Virgem Maria, viveu em tudo a condição
humana, menos o pecado. Anunciou aos pobres a salvação, aos oprimidos, a
liberdade, aos tristes, a alegria”. E para realizar o plano de amor do Pai,
“entregou-se à morte e, ressuscitando dos mortos, venceu a morte e renovou a
vida”.
Mas, há
ainda mais: o Filho, ressuscitado e glorificado, derramou sobre seus discípulos
o Espírito Santo, que é o próprio Amor que o liga ao Pai. Este Espírito de Amor
não é uma coisa, não é simplesmente uma força, não é algo: é Alguém, é o Amor
que une o Pai e o Filho, e agora é, na Igreja de Cristo, o
Paráclito-Consolador, Aquele que dá testemunho de Jesus morto e ressuscitado,
Aquele que vivifica e orienta a Igreja, Aquele que renova em Cristo todas as
coisas. Ele é o Dom que o Filho ressuscitado recebeu do Pai e derramou sobre a
Igreja, para santificar todas as coisas. Este Espírito permanece no nosso meio
na Palavra e nos sacramentos; este Espírito conserva a Igreja unida na mesma fé
e na mesma caridade fraterna, este Espírito é a Força divina, a Energia
criadora que nos ressuscitará, como ressuscitou o Filho Jesus para a glória do
Pai.
É assim
que a Igreja confessa um só Deus, imutável, indivisível, perfeito, eterno,
absolutamente um só. Mas confessa e experimenta igualmente que este Deus único
é real e verdadeiramente Pai, Filho e Espírito Santo, numa Trindade de amor
perfeito e perfeitíssima Unidade. A oração inicial da Missa de hoje, exprime
este Mistério: “Ó Deus, nosso Pai, enviando ao mundo a Palavra da verdade, que
é o Filho, e o Espírito santificador, revelastes o vosso inefável mistério.
Fazei que, professando a verdadeira fé, reconheçamos a glória da Trindade e
adoremos a Unidade onipotente”.
Continuemos,
então, a nossa Eucaristia, na qual torna-se presente sobre o Altar a oferta do
Filho que, por nós, entregou-se ao Pai num Espírito eterno.
Ao Pai,
ao Filho e ao Santo Espírito, Trindade santa a consubstancial, a glória e o
louvor pelos séculos dos séculos. Amém.
Dom
Henrique Soares da Costa
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